1624 / 2022 – Por quem os sinos dobram, mestre John?

1624 / 2022 – Por quem os sinos dobram, mestre John?

9 de janeiro de 2022 0 Por Haroldo Barbosa Filho

Caro mestre John Donne:
Quem sou para dirigir-lhe a palavra, mestre John, senão um leitor despreparado que ousa – chego a pensar, um disparate – fixar os olhos e a alma em seu grandioso poema de 1624 e tecer comentários, trazendo-o para a realidade do Século XXI?

Ainda assim, um leitor, pois que são tão poucos e, menos ainda, principalmente quando se trata da expressão dos bardos, a poesia…

Ainda assim, um leitor… Um mero leitor, se é que cabe a palavra “mero”, que tenta entender seu tempo ido e deseja compará-lo a alguns aspectos deste. Sim, o hoje é muito diferente e, ao mesmo tempo, tão igual ao seu!

De seu leito de convalescença, o mestre acompanhava o som vindo da catedral e perguntava a si próprio “Por quem os sinos dobram?”, ao saber que era anunciada mais uma passagem para o mar das esperanças de uma outra vida, como súplica pela vida eterna e muito melhor que a terrena ou, a poucos, fé inabalável de que ela é o maior paradigma da humanidade, só comparável ao tamanho do Universo.

Então – tão sensível quanto genial – teceu versos sobre a importância de cada ser e, indo ainda mais longe, do respeito aos sofrimentos, dos sentidos de fraternidade e interdependência.

Leio e não faço reparos, apenas baixo a cabeça e admito essas verdades, uma vez que suas linhas corroboram aquilo que sinto, algo vindo de um lugar que só consigo definir como alma.

Sim, os sinos dobravam e hoje, continuam tilintando suas notas, em igual compasso. Os continentes prosseguem em seu fluir, diminuindo, ao passo que a quantidade de seres, naturalmente, aumenta. Mas, há quem queira corromper essa ordem, fazendo com que os povos minguem e, assim, lhes sobre mais espaço de dominação nesses continentes.

Em seu tempo, pode-se dar como desconto o fato de que o egoísmo e a falta de senso, de um modo geral, tinham relação direta com o estágio evolutivo da maioria, ou de praticamente todos. Ora, o que mudou de lá para este tempo? O homem foi à Lua e prepara-se para conquistar terras do planeta mais próximo, Marte… Mas, quanto evoluiu em espírito e gesto?

Mestre, saiba que seu poema foi alçado ao alto da estante, como um dos mais profundos já expressados. Saiba também que, curiosamente, foi plagiado, em forma e conteúdo, tanto no gênero romance quanto na música. Sinto dizer, creio que a prece-alerta em forma de poema não foi compreendida em sua plenitude.

O que me conforta, se é que a atualidade me traz algum conforto, é que suas palavras originais prosseguem intactas, apesar de todos os pesares. No entanto, no ritmo das mudanças para um novo establishment, isso poderá ocorrer a qualquer momento.

O mestre perguntará: “Por quê?”

Não consigo responder, somente lhe mostrar que, durante os Séculos subsequentes ao seu, caminhamos em círculos e voltamos sempre ao mesmo ponto. Com a diferença de que, hoje, é possível até destruir completamente os continentes.

Enquanto isso, o mar torna-se cada vez mais turvo e o homem, sem dar importância à verdadeira poesia…
– Meu caro John Donne!

Os homens, em sua maioria, são ilhas,

A viverem isolados do mundo que os cerca,

Rodeados por seus próprios medos e mesquinhezes

De todos os lados.

Eles se mantêm pequenos, ao largo do Continente,

Em um claustro permanente,

Fingindo ser este seu ideal de liberdade.

Haroldo Barbosa Filho

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