
A morte do Papa Francisco, aos 88 anos, marca o fim de uma era na Igreja Católica e dá início a um momento decisivo para os rumos da fé de mais de 1,4 bilhão de católicos ao redor do mundo. A vacância da Sé Apostólica, já declarada oficialmente pelo Camerlengo, cardeal Kevin Farrell, abre caminho para dois momentos solenes: o funeral do pontífice, marcado para o próximo sábado, e o conclave, que reunirá 135 cardeais com direito a voto na Capela Sistina, em busca de um novo líder espiritual.
A escolha de um novo papa é sempre cercada de expectativas e simbolismos, mas, desta vez, o cenário é ainda mais imprevisível. O colégio de cardeais que decidirá o sucessor de Francisco reflete, como nunca antes, a diversidade e o alcance global da Igreja. Menos da metade dos votantes é europeia — uma ruptura histórica em uma instituição que, por séculos, esteve centrada no Velho Continente. Esse novo perfil é, sem dúvida, um dos grandes legados de Francisco: uma Igreja que olha para além das fronteiras tradicionais e que busca se fazer presente nos desafios contemporâneos, onde quer que eles estejam.
É importante lembrar que cerca de 80% dos cardeais eleitores foram nomeados pelo próprio Francisco. Ainda assim, a diversidade de pensamentos, culturas e prioridades entre eles torna o resultado do conclave uma incógnita. Francisco, ao longo de seu papado, procurou equilibrar nomeações entre perfis mais progressistas e outros mais conservadores, o que contribui para a atual imprevisibilidade.
Entre os nomes mais comentados para sucedê-lo está o cardeal italiano Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano e figura influente nos bastidores da diplomacia vaticana. Sua experiência e proximidade com a estrutura administrativa da Igreja fazem dele um candidato forte, embora sua postura mais diplomática e menos dogmática divida opiniões.
Outro nome relevante é o do cardeal filipino Luís Antonio Tagle, carismático e próximo das causas sociais, visto por muitos como o “Francisco asiático”. Sua eleição seria histórica, representando o primeiro papa asiático e reforçando o deslocamento do eixo católico em direção ao Sul Global. Com sensibilidade pastoral e uma abordagem empática frente às questões sociais, Tagle representa uma continuidade do espírito reformista e humanista do pontífice falecido.
Do continente africano, surgem nomes como os dos cardeais Peter Turkson, de Gana, e Robert Sarah, da Guiné. Turkson, embora conservador em alguns pontos, já se posicionou contra a criminalização da homossexualidade, demonstrando um olhar mais sensível aos contextos culturais e sociais locais. Já Sarah, de perfil fortemente tradicionalista, é o nome preferido entre os cardeais que desejam uma guinada mais ortodoxa e rígida nos rumos da Igreja. Sua trajetória impressiona, assim como sua fidelidade à liturgia tradicional.
Na Europa, desponta também o cardeal húngaro Péter Erdo, admirado por sua inteligência teológica, mas cujas posições firmes contra a migração e o liberalismo social o colocam em sintonia com um setor mais conservador da Igreja — e até de governos, como o do primeiro-ministro Viktor Orban. Embora tenha construído uma boa relação com Francisco e com lideranças africanas, sua eleição pode sinalizar uma reorientação doutrinária.
Entre os italianos mais próximos do espírito de Francisco, está Matteo Maria Zuppi, arcebispo de Bolonha, conhecido por sua atuação entre os mais pobres e pelo envolvimento com comunidades vulneráveis. Apelidado de “padre de rua”, Zuppi simboliza a Igreja do encontro e da misericórdia, tão defendida por Francisco. Se eleito, sua liderança seria uma extensão natural do pontificado anterior.
Em meio a tantas possibilidades, o conclave de 2025 não é apenas um processo de escolha. É também um espelho da Igreja que somos e da que desejamos ser. Mais do que avaliar currículos e doutrinas, os cardeais reunidos sob o teto da Capela Sistina terão diante de si a responsabilidade de decidir entre o medo da mudança e a coragem do Evangelho. Seja quem for o escolhido, ele terá sobre os ombros não apenas a herança de Pedro, mas o desafio de guiar uma Igreja cada vez mais plural, sedenta por justiça, fé e humanidade. O que é bem provável que o próximo Papa será progressista, dificilmente será um conservador.
Neste momento, o mundo observa o Vaticano não apenas com curiosidade, mas com esperança. Afinal, o novo papa não será apenas o sucessor de Francisco. Ele será, acima de tudo, um pastor global, chamado a dialogar com um planeta em ebulição — em guerras, desigualdades e transformações profundas. Que tenha coragem, fé e sabedoria para estar à altura desse chamado.
Ronaldo Castilho é jornalista, bacharel em Teologia e Ciência Política com MBA em Gestão Pública com Ênfase em Cidade Inteligente