Erupção vulcânica alimenta o aquecimento global?
13 de outubro de 2023Aquecimento global em modo turbo
Dia 15 de janeiro de 2022 o vulcão submarino Hunga Tonga-Hunga Ha’apa explodiu. Ele ejetou imensas quantidades de vapor d’água na atmosfera. Cientistas suspeitam de consequências para o nosso clima.
Temperaturas recordes têm sido medidas nos últimos meses em quase todo o mundo. Isso afeta todos os continentes, pois as áreas com clima mais instável e frio ainda não compensaram esse ‘calor excedente’. Os picos de calor observados em períodos cada vez mais longos elevaram a temperatura média global do ar, assim como a temperatura de superfícies oceânica a valores também ainda nunca registrados. Cientistas chamam esse fenômeno de ‘bolha’ e falam sobre ‘ondas de calor marinhas’.
Fatores que provavelmente estão relacionados com a causa da rápida aceleração do aquecimento global observada nos últimos meses são:
- Erupção do vulcão submarino Hunga Tonga-Hunga Ha’apa Tonga em 2022
- Ocorrência do fenômeno El Niño em 2023, que possivelmente se estenderá até 2024
- Áreas de alta pressão estáveis e estacionárias durante o verão de 2023 no hemisfério norte
- Redução da densidade das nuvens de poeira do Deserto do Saara em 2023
A erupção vulcânica mais poderosa da história recente
Dia 15 de janeiro de 2022 o vulcão submarino Hunga Tonga-Hunga Ha’apa, localizado no pacífico sul, explodiu. Essa foi a erupção vulcânica mais poderosa da história recente. Estima-se um total de quase 150 milhões de toneladas de vapor d’água lançados à estratosfera relacionados com a explosão. Essa injeção de vapor d’água equivale a mais de 10% da quantidade comum de vapor d’água existente na camada da atmosfera que fica a uma altitude de cerca de 20 a 50 km, chamada de estratosfera.
A estratosfera é caracterizada como um espaço onde normalmente poucas trocas de vapor d’água acontecem. Ela é regularmente abastecida com um pouco de vapor d’água originado de tempestades de alta altitude.
Provavelmente demorará anos para que o conteúdo de vapor d’água da estratosfera volte ao normal, depois da imensa ‘adição extra’ de vapor d’água resultante da erupção de 2022 do vulcão em Tonga. Esse vapor d’água ‘extra’ já se espalha hoje pelas regiões polares da Terra, onde especula-se que seus efeitos de aquecimento podem até mesmo influenciar o vórtice polar.
Vapor d’água: Gás do efeito estufa
O vapor d’água é considerado o gás do efeito estufa mais danoso para a Terra. Ele está até mesmo à frente do gás carbônico (CO2) que, apesar de ser mais agressivo, está presente em concentrações muito menores na Terra.
Já na metade do ano de 2022 cientistas disseram que um aumento nas temperaturas globais poderia ser esperado como um resultado da erupção de 2022 do vulcão em Tonga. Isso se deve ao fato de que, ao contrário do que ocorre durante erupções comuns, quase nenhum aerossol de resfriamento, por exemplo o dióxido de enxofre (SO2), foi expelido na atmosfera durante essa erupção, o que poderia paralelamente servir como uma espécie de ‘véu’ com o efeito de minimizar a intensidade da luz solar incidente na Terra. Em vez disso, a injeção ‘extra’ de vapor d’água resultante da erupção de 2022 do vulcão em Tonga tem um efeito oposto na Terra, ela faz com que as temperaturas aumentem.
Num estudo publicado no início de 2023 (Nature Climate Change), cientistas da Universidade de Oxford concluíram que a erupção do vulcão em Tonga aumentou em 7% a probabilidade de o aquecimento global ultrapassar a marca de 1,5°C. Outro estudo, publicado em agosto de 2023 (ResearchGate), observa que é importante entender “efeitos plurianuais das anomalias de vapor d’água na estratosfera” no contexto de suas relações com fenômenos climáticos, por exemplo o El Niño, e que são necessárias mais pesquisas.
El Niño
O fenômeno climático El Niño, atualmente reestabelecido, desempenha um papel significativo na elevação incomum das temperaturas do ar e da água. Ele ocorre em intervalos de dois a sete anos e reverte as correntes oceânicas e os sistemas de vento no Pacífico tropical.
As relações entre a ocorrência do El Niño em 2023 e o aquecimento global observadas atualmente são consideradas prováveis, mas elas ainda são objetos de pesquisa a serem estudados.
O El Niño intensifica ou até mesmo provoca ondas de calor regionais (como as recorrentes nos últimos tempos no Norte e Nordeste do Brasil), secas (devastadoras, como as atuais na Amazônia brasileira); bem como tempestades, chuvas catastróficas e inundações (como as registradas atualmente na Região Sul do Brasil).
Áreas de alta pressão muito estáveis e estacionárias
A recorrente ocorrência de áreas de alta pressão particularmente estáveis e estacionárias, registradas no verão de 2023 do hemisfério norte, resultaram em longas ondas de calor nos últimos meses e que causaram o aumento da irradiação do sol em grandes áreas do mar Mediterrâneo, por exemplo.
Poeiras do Deserto do Saara
Outro aspecto referente ao aumento das temperaturas globais do ar e da água pode estar relacionado com o ar ‘menos empoeirado’ sob regiões do Mar Equatorial. Em 2023 os ventos alísios apresentaram-se incomumente mais fracos (ventos alísios são ventos persistentes que sopram dos trópicos em direção à zona equatorial na atmosfera). Isso fez com que uma quantidade consideravelmente menor do que a média dos anos anteriores de poeira advinda do Deserto do Saara entrasse na atmosfera. Como resultado disso o ar nessas regiões ficou mais claro e, portanto, mais permeável à radiação solar.
Jogo de fatores diversos
As curvas de aquecimento de todos esses fenômenos se sobrepõem e se somam umas às outras, colocando temporariamente o aquecimento global em velocidade de turbo. Porém, a injeção de vapor d’água na estratosfera da erupção vulcânica de 2022 em Tonga se dissipará gradualmente, as temperaturas das águas do Oceano Pacífico diminuirão novamente, as áreas estáveis de alta pressão também já mudam consideravelmente de posição e os ventos alísios voltarão a lançar mais poeira do Deserto do Saara na atmosfera do que recentemente.
Isso significa que os fatores que se fazem relevantes para a percepção do clima global atualmente desaparecerão novamente. Isso acontecerá provavelmente num futuro bem próximo. Em conseguinte, será possível determinar melhor, mesmo que aproximadamente, a dimensão de cada um desses eventos na curva de temperaturas do nosso planeta.
Este artigo é baseado nas seguintes publicações, entre outras:
- Jenkins, S., Smith, C., Allen, M. et al. Tonga eruption increases chance of temporary surface temperature anomaly above 1.5 °C. Nat. Clim. Chang. 13, 127–129 (2023). https://doi.org/10.1038/s41558-022-01568-2
- Martin Jucker, Chris Lucas, Deepashree Dutta. Long-term surface impact of Hunga Tonga-Hunga Ha’apai-like stratospheric water vapor injection. August 04, 2023. https://www.researchgate.net/publication/372889143_Long-term_surface_impact_of_Hunga_Tonga-Hunga_Ha%27apai-like_stratospheric_water_vapor_injection